Varejistas: retomada ou voo de galinha?
Olá, investidores.
Aqui é o Victor Bueno, analista de ações na Nord Research.
Após praticamente um ano sofrendo com duras quedas, as ações de grandes varejistas brasileiras, como Magalu (MGLU3), Via (VIIA3) e Americanas (AMER3), começaram a apresentar seguidas movimentações positivas – tendo subindo, em média, cerca de +40 por cento nas últimas duas semanas.
Mas o que a maioria dos investidores está se perguntando é: “finalmente chegou o momento da virada de chave e a hora de comprar as ações dessas empresas?”
A pergunta tende a se dirigir, principalmente, ao Magalu, um dos maiores cases de sucesso da nossa bolsa de valores nos últimos anos (para não falar da história), tendo se tornado um dos queridinhos do investidor pessoa física. Porém, assim como as ações da companhia de Luiza Trajano, os papéis das outras grandes varejistas brasileiras também estão sofrendo bastante, e os investidores estão ansiosos aguardando uma possível oportunidade.
Mas antes de analisarmos essas empresas para identificarmos se realmente existe essa possibilidade, devemos entender o que está por trás das grandes quedas de suas ações e o que pode vir por aí.
Trouxe, aqui, alguns motivos que explicam o movimento que estamos vendo nos últimos meses para as ações das varejistas.
Cenário macro desafiador
Quando falamos sobre o varejo, o principal ponto que devemos levar em consideração para identificar uma boa oportunidade é o cenário atual e como os fundamentos das empresas desse setor estão ligados a ele.
É de amplo conhecimento da maioria dos investidores que não estamos em um cenário macro favorável para grande parte das empresas na bolsa de valores, com uma pressão inflacionária que custa a cessar e altas do juros que impactam diretamente o ímpeto ao consumo por parte da população brasileira. E qual é o grande medo do momento? A recessão.
Com tudo isso, torna-se cada vez mais difícil para as companhias repassarem os preços nas vendas de produtos ou serviços e, consequentemente, manter as margens neste cenário turbulento.
Vale ressaltar que, além dos impactos diretos de curto prazo nos fundamentos das varejistas, também é possível ver como o aumento da taxa de juros impacta as ações dessas empresas, tendo em vista que muitas delas possuem uma grande parcela de seus valores nos lucros que darão no futuro. Com o aumento dos juros, existe uma elevação da taxa de desconto dos modelos de valuation dos analistas, o que reduz os “preços justos” das companhias analisadas – impactando negativamente nas oscilações diárias de suas ações.
Voltando para o cenário, ainda existe um combo de incertezas relacionadas às eleições de 2022 + uma situação fiscal frágil, o que está afastando a confiança dos investidores em investir em renda variável neste momento, em especial em empresas de setores como o varejo.
Concorrência cada vez mais forte
Além do cenário, outro ponto também vem tirando cada vez mais o sono das empresas do varejo: a concorrência.
Não é de hoje que as varejistas brasileiras precisam lidar com concorrentes internos e, principalmente, externos, como Mercado Livre e Amazon. Porém, ultimamente, o maior risco concorrencial está vindo do outro lado do globo, com companhias asiáticas ganhando cada vez mais espaço no Brasil.
Esse fenômeno não é tão difícil de ser explicado, ao passo que empresas como Shopee, AliExpress e Shein oferecem produtos por preços bem inferiores aos praticados pelas varejistas nacionais, aproveitando-se de uma mão de obra mais barata e um menor rigor por qualidade neste cenário de pressão ao consumo interno.
Ainda que empresas como o Magalu estejam avançando em seus canais digitais e em suas estratégias de omnicanalidade, os números mostram uma preferência cada vez maior por aplicativos de companhias internacionais. A Shopee, por exemplo, teve 7x mais acessos em seu app em relação ao do Magalu no mês de maio e já possui seis centros de distribuição para sustentar a sua logística no país.
Mas e os fundamentos dessas empresas?
O cenário e a concorrência estão definitivamente refletindo negativamente nas oscilações diárias das ações das varejistas. Mas será que elas estão perdendo os seus fundamentos ou até mesmo correndo o risco de falência (como disse Luiz Barsi recentemente)?
Bom, começando pelo Magalu, não. Pelo menos não no curto ou médio prazo.
Ainda que exista uma pressão em suas margens por conta do cenário e que tenha cometido erros pontuais em sua gestão de estoques durante a pandemia (o que está fazendo com que precise realizar liquidações relevantes), o Magalu continua construindo um sólido ecossistema de produtos e serviços oferecidos aos seus clientes e sellers. Em dois anos, a companhia já realizou 20 aquisições para fortalecer essa proposta.
Os planos da gigante varejista são de continuar crescendo com base em cinco pilares principais: o crescimento exponencial do seu marketplace, entrar em novas categorias, o seu Super App, uma entrega ainda mais rápida, e o MaaS (Magalu as a Service, no qual a empresa vende diversos serviços para os sellers em sua plataforma).
Mesmo com as iniciativas positivas e que estão trazendo crescimento em suas receitas, o lucro da companhia vem caindo nos últimos trimestres e as ações vêm acompanhando esse movimento.
Com isso, as ações já acumulam queda de -88 por cento no período de um ano – ou seja, para voltar para os patamares vistos em julho/21, os papéis precisariam subir aproximadamente +900 por cento!
Porém, aqui, não devemos assumir que uma recuperação dessas deve acontecer do dia para a noite, pelo simples fato das movimentações vistas nas últimas duas semanas. O Magalu traz, sim, bastante visibilidade de crescimento a longo prazo, mas o presente ainda é nebuloso e deve trazer cautela aos investidores – até mesmo aos mais “longo prazistas”.
Um cenário semelhante se aplica a Americanas, companhia que também vem diversificando suas operações para competir com outras empresas do e-commerce. A Americanas é, inclusive, uma das maiores plataformas de comércio digital no país – principalmente por ser resultado da fusão entre as gigantes Lojas Americanas e B2W.
Essa fusão trouxe uma grande expansão dos resultados da companhia nos últimos trimestres, entretanto, as ações de AMER3 não seguiram pelo mesmo caminho e entraram na “cesta” das varejistas com o mau humor atual do mercado.
Mesmo se diferenciando dos concorrentes e oferecendo um leque completo de produtos e serviços, que vão desde o seu varejo tradicional em lojas físicas até sua conta digital (Ame), os papéis da Americanas amargam queda de -77 por cento desde a metade de 2021. Assim como MGLU3, AMER3 também deve continuar sentindo os impactos do cenário em suas movimentações de curto-médio prazo.
A última, mas não menos perguntada pelos investidores, é a Via. A companhia, que atravessou algumas polêmicas em seu passado, também é mais uma a sofrer com o cenário inflacionário e de alta dos juros, mas que, assim como as duas primeiras, também vem se esforçando para melhorar as suas operações e agora passa por um momento de reestruturação.
No entanto, além do cenário desfavorável e da concorrência batendo à porta, a empresa apresentou quedas em seus últimos resultados, que foram impulsionadas por altas provisões trabalhistas e ajustes não recorrentes. Esses fatores trazem um maior risco ao negócio, e o processo de turnaround deve ser acompanhado de perto.
Com a queda dos resultados por fatores externos e internos, as ações já caem -84 por cento nos últimos doze meses, refletindo um receio por parte do mercado com relação ao cenário atual e à sua perspectiva de entregar resultados positivos no futuro.
Conclusão
As ações das três varejistas aqui citadas apresentaram movimentações positivas nas últimas duas semanas e que podem ser explicadas por uma melhora nos dados do setor de serviços e na redução das projeções para inflação daqui para frente.
Além disso, com as quedas recentes de empresas ligadas a commodities ou até mesmo grandes bancos, podemos estar presenciando uma rotação de carteira, com o mercado voltando suas atenções para ativos que até então estavam escanteados.
Ainda que os papéis dessas empresas tenham respirado um pouco após as quedas nos últimos meses, o cenário de curto prazo continua incerto e altamente desafiador para elas – sendo cedo ainda para afirmar sobre uma possível recuperação das varejistas daqui para frente.
As companhias citadas aqui, especialmente falando sobre Magalu e Americanas, possuem seus diferenciais competitivos e estão se movimentando para superar o cenário macro desfavorável e a concorrência cada vez mais forte no território brasileiro.
Com os riscos e incertezas de curto prazo relacionados às varejistas, acredito que o momento ainda é de cautela e precisamos aguardar sinalizações mais claras (principalmente por parte das empresas) de que o cenário pode ter mudado e que realmente agora é o momento certo para se tornar sócio delas.
Mas e aí, você acredita em uma retomada neste momento para as ações das varejistas ou os últimos movimentos são apenas um “voo de galinha”?