O que é arcabouço fiscal e como ele impacta a política?
As discussões sobre o arcabouço fiscal voltaram a ganhar destaque recentemente devido ao aumento da percepção de risco fiscal no Brasil. Esse risco fiscal ocorre quando investidores, economistas e a sociedade em geral passam a enxergar que o governo pode ter dificuldades em equilibrar suas contas, gerando preocupações sobre o endividamento e a capacidade de o país se financiar.
O que é arcabouço fiscal?
O arcabouço fiscal no Brasil refere-se a um conjunto de regras e normas que orientam a política fiscal do governo, com o objetivo de garantir a sustentabilidade das contas públicas a longo prazo. Ele visa limitar o crescimento das despesas públicas e assegurar que o governo mantenha controle sobre o endividamento, promovendo um equilíbrio entre receitas e despesas. A ideia central é que o governo consiga gerar superávits fiscais ao longo dos próximos anos.
O que substituiu o teto de gastos?
O atual arcabouço fiscal foi instituído oficialmente em agosto de 2023, durante o governo Lula. Ele veio como uma substituição ao teto de gastos, que havia sido criado em 2016 durante o governo Michel Temer, mas que passou a enfrentar críticas devido à sua rigidez, especialmente em momentos de crise econômica e necessidades de maior investimento social.
Novo arcabouço fiscal
Em 2023, o Congresso aprovou a nova regra fiscal para substituir a regra do teto de gastos. O governo de Lula flexibilizou o arcabouço fiscal, oferecendo mais espaço para o aumento de despesas em áreas consideradas prioritárias, como saúde, educação e investimentos públicos. Essa flexibilização foi importante para conciliar a necessidade de controle fiscal com demandas sociais e econômicas, permitindo que o governo ampliasse gastos com políticas públicas sem romper completamente com a responsabilidade fiscal.
Relação com as metas primárias do governo
As metas primárias estão diretamente relacionadas ao arcabouço fiscal. Elas representam a diferença entre as receitas e as despesas do governo, excluindo os gastos com juros da dívida pública. O arcabouço fiscal define metas primárias a serem atingidas ao longo dos anos, estabelecendo limites para o déficit fiscal ou buscando superávits.
O governo Lula, ao flexibilizar o arcabouço, introduziu uma nova estratégia fiscal em que as metas de superávit primário são importantes, mas têm certa margem de manobra para ajustarem-se às circunstâncias econômicas.
O que está dentro do Arcabouço Fiscal?
- Despesas primárias: gastos com educação, saúde, infraestrutura e outros investimentos públicos.
- Metas de resultado primário: os objetivos de superávit ou déficit que o governo busca alcançar em termos fiscais.
- Critérios para ajuste de despesas: mecanismos que permitem ajustes automáticos nos gastos, caso as metas de resultado primário não sejam atingidas.
O que está fora do Arcabouço Fiscal?
- Despesas com juros da dívida pública: como o cálculo do resultado primário não inclui os juros, esses gastos não fazem parte das regras do arcabouço.
- Algumas áreas de investimentos estratégicos: o governo pode excluir temporariamente certos investimentos específicos do arcabouço, como aqueles relacionados a grandes obras de infraestrutura ou programas sociais prioritários, dependendo de regulamentações adicionais ou da situação econômica do país.
Gastos no Orçamento de 2024
Atualmente, a gestão do arcabouço fiscal está no centro de debates sobre como garantir o crescimento econômico sem comprometer a sustentabilidade das contas públicas.
No primeiro ano do Lula 3, o déficit primário do governo foi de R$ 231 bilhões. Para 2024, o governo prevê um novo déficit de R$ 69 bilhões, apesar do desempenho recorde de arrecadação pública.
É importante destacar que a meta do arcabouço fiscal para 2024, após o afrouxamento das metas implementado no começo deste ano, é alcançar um déficit zero. Mas o governo afirma que conseguirá cumprir essa nova meta, pois há uma margem de tolerância de até -0,25% do PIB, o que permite um déficit de aproximadamente R$ 29 bilhões neste ano, além do fato de que mais de R$ 40 bilhões serão contabilizados fora do limite fiscal.
Arcabouço e a proposta do Orçamento de 2025
O Projeto para Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025 precisa obedecer às regras do novo arcabouço fiscal. Contudo, o cenário para o próximo ano é ainda mais desafiador sem as receitas extraordinárias que foram capturadas neste ano.
Para 2025, a nova meta passou a ser também de um déficit zero e o governo prometeu entregar, em 2026, um superávit de +0,25% do PIB. A projeção do governo para 2025 é de um superávit de R$ 3,7 bilhões, mas que se torna um déficit de efetivo de mais de R$ 40 bilhões levando em consideração o que é descontado do cálculo da meta. Atualmente o mercado projeta um déficit cheio (sem descontos) de mais de R$ 100 bilhões para 2025.
Além de usar a banda inferior da meta como se ela fosse de fato a meta, o grande problema é que o número que importa para a trajetória da dívida pública é o déficit efetivo (incluindo o que o governo retira do cálculo oficial da meta fiscal).
No entanto, as projeções do mercado atualmente são de déficits efetivos em todos os 4 anos do governo Lula 3, o que nos afasta ainda mais da estabilização da dívida (que só seria alcançada com uma sequência de superávits primários).
Com alta dos gastos públicos, Banco Central volta a subir a Selic
Como a responsabilidade fiscal não parece ser uma prioridade para o atual governo, o Banco Central foi obrigado a iniciar um novo ciclo de alta na taxa Selic, o que torna o cenário das contas públicas ainda mais desafiador. O mercado já estima que a dívida pública ultrapasse o patamar de 80% do PIB em 2025.
O fato é que sem mexer na vinculação dos gastos com saúde e educação ou mexer em algumas regras de crescimento da despesa obrigatória, dificilmente o governo conseguirá entregar os superávits fiscais necessários para estabilizar a dívida e alcançar o objetivo de retomar o grau de investimento pelas agências de classificação de risco para o Brasil.