Finalmente chegou a hora de comprar as ações da Locaweb?
Olá, investidores.
Aqui é o Victor Bueno, analista de ações na Nord Research.
Você já deve ter percebido nos últimos doze meses que as ações de empresas de tecnologia estão sofrendo muito mais do que a média do mercado, com desvalorizações que vão desde -40 por cento até mais de -90 por cento nesse período.
Esse fato vem chamando a atenção dos investidores, pois essas mesmas ações eram aquelas que estavam apresentando as melhores performances frente ao Ibovespa até a metade do ano passado.
Com isso, muitos investidores acabam se perguntando: “será que essas empresas realmente valiam tudo aquilo que eram negociadas?”; ou até mesmo: “será que essas empresas realmente valem alguma coisa?”.
Bom, não vou aqui analisar todas as techs brasileiras para saber se elas possuem bons fundamentos e visibilidade de crescimento ou ainda se realmente valem o preço que o mercado está pagando neste momento.
Estou aqui para analisar uma das principais delas e que está na boca do investidor após seus papéis caírem -73 por cento desde julho de 2021: a Locaweb (LWSA3).
Antes de qualquer coisa, é bom nos situarmos sobre o cenário atual que as empresas de tecnologia vêm enfrentando (tanto no Brasil quanto nos EUA) e quais são os impactos diretos em suas ações.
O cenário das ações de tecnologia do Brasil e nos EUA
Já não é nenhum mistério que as ações de tecnologia tendem a apresentar uma maior volatilidade em relação à média do mercado — ou seja, quando o mercado como um todo está em alta, as ações techs tendem a apresentar altas mais expressivas, assim como o inverso também é verdadeiro.
No mercado americano, existem dois índices relevantes e que podem representar essas diferentes oscilações entre as ações de empresas de tecnologia e o restante do mercado — o S&P500 (índice com as 500 principais empresas listadas na bolsa americana) e o Nasdaq, índice voltado para as techs americanas.
Ainda que as quedas das ações no país norte-americano tenham iniciado apenas em 2022 (após forte rally de alta depois dos piores momentos da pandemia), é possível ver uma maior volatilidade nas movimentações da Nasdaq em relação ao S&P500.
Enquanto o principal índice dos Estados Unidos apresentou queda de -9,5 por cento considerando os últimos doze meses, o índice de tecnologia caiu praticamente 50 por cento a mais, registrando queda de -15,9 por cento nesse mesmo período analisado.
Já no Brasil, ainda que não tenhamos um índice de tecnologia tão relevante quanto o Nasdaq, existe um que foi criado pela Teva Índices — empresa pioneira em prover índices para ETFs no Brasil — e que é composto especificamente por techs e fintechs brasileiras, além de algumas de outros países da América Latina, como o Mercado Livre da Argentina.
Quando comparamos as movimentações desse índice em questão com as do Ibovespa (nosso principal índice acionário), vemos uma diferença muito maior entre as duas desde a metade do ano passado. Enquanto o Ibovespa cedeu -19,3 por cento no período, o índice brasileiro de ações tech apresentou uma incrível queda de -66,7 por cento.
A relação entre os dois índices no Brasil mostra com ainda mais clareza a diferença entre a volatilidade das ações de tecnologia e a média do mercado.
Por que as techs brasileiras estão sofrendo mais do que as americanas?
O principal ponto que explica essa diferença quase gritante é o cenário macro que os dois países estão atravessando nesses últimos doze meses, principalmente quando olhamos para o cenário dos juros.
Por conta do avanço da inflação pós-pandemia, o Brasil deu início ao seu ciclo de alta de juros ainda no começo de 2021, saindo de uma taxa básica de juros de +2 por cento ao ano para os +13,25 por cento atuais. Com o aumento constante e acelerado, não demorou para a nossa bolsa de valores ser impactada negativamente: o Ibovespa foi de 130 mil pontos nas máximas do ano passado para os 98 mil pontos em que se encontra atualmente.
Ainda que existam os reflexos diretos dos juros nos fundamentos de algumas grandes empresas listadas, os impactos também são diretos na maioria dos papéis, ao passo que existe uma migração de portfólios para instrumentos de renda fixa (que voltam a se tornar atrativos nesses momentos) e por conta de um aumento dos juros interferir também nas planilhas de valuation dos analistas de grandes instituições financeiras.
Esse último motivo ocorre pelo fato de que, com maiores juros, existe uma elevação na taxa de desconto nos modelos analisados e, consequentemente, uma redução dos “preços justos” ao trazer os resultados projetados a valor presente — o que impacta principalmente as ações de crescimento e de tecnologia, que possuem grande parte de seus valores em seus lucros futuros.
Enquanto isso, ao que tudo indica pelas sinalizações do FED (o banco central americano), os Estados Unidos ainda estão apenas no começo de um possível ciclo de alta de juros, o que pode trazer ainda mais quedas para a sua bolsa e um maior distanciamento entre os seus principais índices.
O que tudo isso tem a ver com a Locaweb?
Antes de tudo, é importante eu explicar o que é a Locaweb.
A companhia foi criada em 1997 com a missão de ajudar as empresas a nascerem e prosperarem por meio da tecnologia — missão que carregam até hoje e que é diretriz para os gestores realizarem aquisições e trabalharem no desenvolvimento interno dos produtos.
Quem conheceu e se lembra da Locaweb somente no período pré-IPO (fevereiro de 2020) ainda deve pensar que a companhia só atua com serviços de hospedagem de sites fornecidos a outras empresas — principalmente do varejo.
Porém, a realidade atual é outra.
Após passar praticamente ilesa pela “Bolha da Internet”, em 2000, inclusive batendo a marca de 10 mil clientes, a Locaweb passou a ir além das hospedagens, e três anos depois começou a oferecer também soluções de data center e, cinco anos depois, já estaria entrando no mercado de computação em nuvem.
Em 2010, a companhia recebeu um aporte do fundo de private equity Silver Lake, que contribuiu para a expansão das operações da empresa no país. Após dois anos, realizou a aquisição da plataforma de e-commerce Tray, inaugurando a nova vertical de Commerce.
Com o avanço da Tray, a Locaweb passou a oferecer uma plataforma completa para pequenas e médias varejistas criarem o seu próprio e-commerce, além de outros serviços como meios de pagamentos, suporte à logística e omnichannel, integração com marketplaces, treinamentos, entre outros.
Atualmente, o Commerce é área da Locaweb que cresce de forma mais acelerada, além de ter mais relevância e apresentar melhores margens. Em menos de 10 anos desde a sua criação, o Commerce já representa 58 por cento da receita total da Locaweb, e a tendência é que esse número alcance algo próximo a 70~80 por cento nos próximos anos.
Além do Commerce, a companhia também passou a ter uma vertical de SaaS (Software as a Service) em suas operações, oferecendo serviços que vão desde criação de sites e lojas virtuais até soluções para aumentar a produtividade de PMEs no varejo brasileiro.
Inclusive, vale ressaltar que as empresas que atuam no segmento possuem uma métrica para medir seus crescimentos chamada de “regra dos 40”. A regra adotada é basicamente a soma do crescimento de suas receitas e suas margens Ebitda — se o resultado for superior a 40 por cento, é um indício de que a tech está apresentando um alto crescimento.
Atualmente, desconsiderando a vertical de Commerce, a Locaweb apresenta um número próximo a 46 por cento.
Após entrar na bolsa de valores e se capitalizar, a empresa realizou incríveis 13 aquisições em um período de pouco mais de dois anos. O foco das compras foi exatamente em expandir ainda mais o seu leque de serviços e reduzir a dependência de apenas uma fonte de receita (hospedagem) — principalmente fortalecendo o Commerce.
Ainda que o objetivo no momento seja integrar as empresas adquiridas nos últimos anos, a companhia não está fechada para novas aquisições e possui uma situação confortável em seu balanço.
Atualmente, a empresa possui uma posição de caixa de 1,6 bilhão de reais (realizaram follow-on em 2021) e praticamente não possui dívidas, o que traz conforto e segurança para seguir a sua estratégia de crescimento orgânico e inorgânico sem se alavancar demais.
Com uma oferta mais completa de serviços, a Locaweb contribui para que os seus clientes consigam prosperar em um mercado dominado por grandes varejistas, como Magalu e Americanas. Atualmente, as pequenas e médias empresas do setor não possuem áreas de tecnologia, marketing — o que as deixa muito atrás de seus concorrentes.
Quanto mais a empresa enriquece o seu ecossistema, mais ela aumenta a capacidade de trazer novos clientes e fidelizar os que já estão dentro. Essa é a grande tese de crescimento a longo prazo da Locaweb.
Além disso, a companhia está em um mercado sem grandes competidores diretos no país (possuem vendas 4,5x maiores do que o segundo player, a Nuvem Shop) e existe muito espaço para expansão em território nacional, tendo em vista que a penetração do e-commerce é de apenas 12 por cento no Brasil, enquanto na China é de 35 por cento e, nos EUA, acima de 32 por cento.
Mas o que acontece com as ações da Locaweb?
Assim como outras empresas de tecnologia, as ações da Locaweb também apresentam uma altíssima volatilidade e muitas vezes se tornam manchetes de final de pregão entre as maiores altas e baixas do dia.
Recentemente, inclusive, os papéis da empresa se destacaram entre as melhores performances do Ibovespa e registraram a maior alta desde o seu IPO, com valorização de mais de +16 por cento no dia (20/07/22).
Porém, a verdade é que a volatilidade vem impactando de uma forma muito mais negativa do que positiva nos últimos meses. As ações da empresa registraram queda de -73,1 por cento desde a metade de 2021 – maior do que a queda apresentada pelo índice de tecnologia brasileiro e quase 4x maior do que a apresentada pelo Ibovespa no período em questão.
Detalhe: se formos levar em consideração as quedas desde as máximas atingidas por LWSA3, em fevereiro do ano passado, a desvalorização das ações seria ainda maior, chegando a mais de -85 por cento.
Conclusão
Mas se as ações da Locaweb não param de cair e a empresa apresenta visibilidade de crescimento no longo prazo, isso não quer dizer que estamos diante de uma grande oportunidade na bolsa brasileira?
É aí que precisamos ter cautela.
Realmente, neste cenário desfavorável de juros, os papéis da Locaweb já perderam praticamente ¾ de seu valor em menos de um ano e a empresa pode, sim, continuar crescendo com uma oferta de serviços cada vez mais diversificada em um mercado altamente subpenetrado.
Porém, o que vemos em seu histórico de resultados é que, apesar do crescimento de suas receitas nos últimos trimestres, as suas margens estão sendo cada vez mais comprimidas – apresentando uma leve melhora apenas no primeiro trimestre deste ano.
O principal motivo para as quedas de suas margens (principalmente margens Ebitda e líquida — linhas azul e branca no gráfico acima) é exatamente por conta das margens das empresas que foram adquiridas nos últimos anos e que (ainda) são negativas em sua maioria.
Ainda que exista uma boa expectativa com relação à melhora dos resultados dessas empresas (e consequentemente de suas margens) ao passo que vão sendo incorporadas e beneficiadas por ganhos de sinergia, este é, sim, um ponto de risco a ser levado em consideração antes de comprar ou não LWSA3.
O mercado parece ter boas projeções para os resultados daqui para frente, porém precisamos de indícios mais claros e sólidos do potencial crescimento que a Locaweb pode entregar nos próximos anos, afinal, as ações acompanham os resultados no longo prazo. Além disso, mesmo após as fortes quedas, a empresa continua negociando a 23x Ebitda — o que não acreditamos ser um preço que compense os riscos e incertezas do negócio neste momento.
Neste relatório, destacamos os tópicos da Locaweb que vemos como os mais importantes e analisamos o histórico de crescimento nos últimos anos.
Espero que você tenha gostado.
Um abraço,