Corte de gastos do Governo: o que muda com o novo pacote econômico
O pacote de corte de gastos do governo federal, apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem como meta central reduzir o déficit fiscal e fortalecer o compromisso com a responsabilidade econômica. O objetivo é economizar entre R$ 30 bilhões e R$ 40 bilhões por ano nos próximos dois anos, totalizando R$ 70 bilhões até 2026. A promessa de "déficit zero", defendida desde o início do governo Lula, ganha reforço com essas medidas, mas a inclusão do aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda surpreendeu o mercado e levantou questionamentos sobre o equilíbrio entre arrecadação e despesas.
A seguir, entenda detalhadamente cada medida anunciada, os desafios do governo em implementá-las e os impactos esperados na economia e na vida dos brasileiros.
O que é o pacote de corte de gastos do governo?
O pacote anunciado em rede nacional pelo ministro da Fazenda inclui uma série de ajustes fiscais para reduzir o rombo nas contas públicas. A proposta veio em um momento de pressão crescente para alcançar a meta de déficit zero em 2024, enquanto o governo enfrenta desafios como aumento de gastos obrigatórios, arrecadação insuficiente e volatilidade econômica global.
O plano não apenas busca cortar despesas, mas também inclui medidas que reorganizam benefícios sociais e tributários, impondo limites ao crescimento de gastos com emendas parlamentares, salários no funcionalismo público e previdência.
Entretanto, o anúncio de uma nova isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil trouxe um contraste com o restante do pacote, criando preocupações sobre o impacto fiscal.
Principais medidas do pacote de corte de gastos
Limitação do crescimento do salário mínimo
Uma das propostas mais significativas do pacote é a criação de um teto para o aumento real do salário mínimo. Ele continuará a subir acima da inflação, mas o reajuste estará limitado a 2,5% ao ano além dos índices inflacionários, de acordo com o arcabouço fiscal.
Antes, o salário mínimo era corrigido com base na inflação do ano anterior e no crescimento do PIB de dois anos antes, sem limites adicionais. Agora, o governo busca controlar o ritmo desse aumento para evitar impactos maiores nos gastos públicos obrigatórios, como aposentadorias e benefícios sociais atrelados ao salário mínimo.
Impacto esperado: A medida pode gerar economia significativa para o governo, mas pode enfrentar resistência da população e de sindicatos, que enxergam perda de poder de compra para os trabalhadores e aposentados.
Combate aos supersalários no setor público
Outra frente do pacote é o combate aos supersalários no funcionalismo público. O governo quer garantir que todos os agentes públicos respeitem o teto constitucional de R$ 44.008,52 mensais.
Hoje, algumas categorias conseguem ultrapassar esse teto por meio de benefícios, adicionais e gratificações. Com a regulamentação proposta, o governo busca cortar excessos e criar maior transparência na remuneração do setor público.
Impacto esperado: Além da economia direta, a medida atende a uma demanda social por maior igualdade no tratamento dos servidores públicos.
Mudanças na previdência dos militares
A previdência dos militares também foi incluída no pacote. Entre as alterações propostas estão:
- Instituição de uma idade mínima para a reserva (hoje inexistente).
- Limitação da transferência de pensões para dependentes.
Essas mudanças visam tornar a previdência militar mais sustentável no longo prazo.
Impacto esperado: Com uma estrutura previdenciária mais alinhada às regras aplicadas ao restante da população, a medida pode gerar economia significativa, mas enfrentará forte oposição de associações militares.
Redução do abono salarial
O governo anunciou a redução do limite de renda para quem tem direito ao abono salarial. Hoje, o benefício é destinado a trabalhadores que recebem até dois salários mínimos (R$ 2.824). A nova proposta reduz gradualmente esse limite até que ele alcance 1,5 salário mínimo.
A mudança será feita de forma escalonada, corrigindo o valor pela inflação ano a ano, e busca focar o benefício em trabalhadores de renda mais baixa.
Impacto esperado: Embora a medida tenha impacto positivo nas contas públicas, há risco de descontentamento popular, já que restringe o acesso a um benefício muito popular entre trabalhadores de baixa renda.
Limitação das emendas parlamentares
O crescimento das emendas parlamentares será limitado a 2,5% acima da inflação. Além disso, 50% das emendas destinadas por comissões terão que ser obrigatoriamente aplicadas em saúde pública.
Impacto esperado: Essa medida busca controlar a expansão das emendas, que consomem boa parte do orçamento público, além de direcionar recursos para áreas prioritárias como a saúde.
Proibição de novos benefícios fiscais
Sempre que houver déficit primário nas contas públicas, novos benefícios fiscais — como isenções de impostos e reduções tributárias — não poderão ser criados.
Impacto esperado: A medida reforça a responsabilidade fiscal, mas dependerá da capacidade do governo em resistir a pressões políticas de setores empresariais.
Aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda: uma decisão controversa
A grande surpresa do pacote foi o anúncio da elevação da faixa de isenção do Imposto de Renda para até R$ 5 mil, beneficiando cerca de 36 milhões de brasileiros. A medida, prometida durante a campanha de Lula, deve entrar em vigor apenas em 2026 e terá impacto fiscal estimado em R$ 35 bilhões por ano.
Para compensar essa perda, o governo propôs uma tributação mínima de 10% sobre rendimentos acima de R$ 50 mil por mês, incluindo dividendos, atualmente isentos de tributação.
Reação do mercado: A inclusão dessa medida gerou desconfiança sobre o compromisso do governo com a responsabilidade fiscal. No dia do anúncio, o dólar fechou a R$ 5,91, o maior valor nominal da história, e o Ibovespa caiu 1,73%.
Reações do mercado e dos especialistas
Economistas e analistas do mercado financeiro reagiram de forma mista ao pacote.
Pontos positivos:
- O pacote representa um passo na direção correta ao abordar problemas como os supersalários e a sustentabilidade previdenciária.
- A limitação de emendas parlamentares e a proibição de novos benefícios fiscais reforçam a responsabilidade com as contas públicas.
Pontos negativos:
- A isenção do IR foi vista como uma contradição no contexto de cortes de gastos, já que reduz a arrecadação em um momento delicado.
- A meta de economizar R$ 70 bilhões foi considerada insuficiente para estabilizar a relação dívida/PIB no longo prazo.
Especialistas também alertam que as medidas dependem de aprovação no Congresso, o que pode atrasar ou modificar o impacto final do pacote.
O que esperar para os próximos meses?
A implementação do pacote fiscal será um teste de fogo para o governo. O sucesso dependerá de articulações políticas com o Congresso, especialmente em relação às medidas mais impopulares, como o ajuste no salário mínimo e a redução do abono salarial.
Além disso, será fundamental apresentar mecanismos claros para compensar a perda de arrecadação com o aumento da isenção do IR, mantendo o equilíbrio fiscal.
No curto prazo, o mercado continuará atento às ações do governo, e a volatilidade pode persistir. No longo prazo, o pacote representa um esforço importante para conter o aumento da dívida pública e garantir maior sustentabilidade econômica.