A distribuidora de insumos agrícolas Agrogalaxy (AGXY3) anunciou na quarta-feira, 18, que entrou com um pedido de recuperação judicial depois de ter deixado de pagar uma amortização de R$ 70 milhões em Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) que vencia ontem.

Além do pedido de recuperação judicial, a empresa informou a renúncia do CEO e de cinco dos nove membros do conselho.

A situação crítica da Agrogalaxy acende um alerta para os investidores de fiagros. Isso se deve ao fato de que, nos CRAs, há alguns credores relevantes, como os Fiagros da Capitânia, JGP e XP Asset. 

Entenda os detalhes sobre a RJ da Agrogalaxy e os possíveis impactos para os investidores de fundos de agronegócio.

O que está acontecendo com a Agrogalaxy?

A recuperação judicial não é exatamente uma surpresa para aqueles que acompanham o setor. A Agrogalaxy nunca foi uma boa empresa e dava sinais de que algo iria dar ruim desde o IPO.

A Agrogalaxy é uma rede de lojas de sementes de soja e milho (92% da receita), adubo e defensivos agrícolas, o que parecia interessante, dado o excelente histórico de uma das nossas empresas favoritas, a 3Tentos (TTEN3).

Desde o início, a Agrogalaxy apresentou uma alta alavancagem (5x dívida líquida/Ebitda no IPO), além de um recorrente histórico de resultados em queda, Ebitda negativo e prejuízos, causados pela aceleração desenfreada da companhia em aquisições.

Aos que estão mais familiarizados, a história estava contada. Uma companhia infla o seu balanço com aquisições, e, mesmo alavancada, usa a desculpa de crescimento para fazer um ótimo IPO. Agrogalaxy veio cara e cheia de problemas. Ficamos de fora desde o princípio

O mix de financiamento de equity e (mais) dívida foi a receita para a bomba explodir. O cenário agro favorável até 2023 permitiu que a companhia tivesse um respiro e apresentasse até um modelo de lucro líquido.

Em 2023, as commodities sofreram uma forte queda,sobretudo soja e milho, prejudicando diretamente os resultados da companhia.

Desempenho dos papéis da Agrogalaxy comparado ao histórico de lucro/prejuízo. Fonte: Bloomberg

A companhia também atuava como uma espécie de microtrading, dado que cerca de 80% das suas operações eram “barter” (vendas à prazo). Imagine um cenário em que os produtores compravam os insumos da companhia e pagavam somente depois. Com os problemas de safra, os pagamentos não vieram e a companhia morreu na praia.

Devido aos problemas na safra atual e à falta de visibilidade na safra futura, a alavancagem aumentou mais e os resultados ficaram cada vez menores.

O plano da agrogalaxy para sair da recuperação judicial

A AgroGalaxy implementou uma reestruturação estratégica e operacional para garantir a sustentabilidade de suas operações. A companhia reduziu o número de lojas, silos e pontos comerciais, concentrando-se em 74 unidades nas regiões com maior potencial de geração de caixa: Sul, Sudeste, Cerrado Oeste e Cerrado Leste. A realidade da empresa, que chegou a ser uma das líderes do processo de consolidação do mercado de distribuição de insumos no país, agora é o encolhimento.

Quais fundos possuem posição em CRAs emitidos pela Agrogalaxy?

  • CPAC11
  • XPAG11
  • AZQA11
  • JGPT11 
  • KJNT11

Segundo comunicado da XP Investimentos, os fundos mencionados foram temporariamente suspensos de negociação no mercado secundário de balcão. A princípio, essa medida visa proteger os investidores até que haja maior clareza sobre o impacto dessa inadimplência no setor.

Além dos fundos citados, o CPTR11, AGRX11, AAZQ11, XPCA11, BBGO11 e JGPX11 são os listados que também possuem exposição ao papel. É esperada uma maior volatilidade nesses fundos na b3.

Calote de CRAs da AgroGalaxy e impacto nos Fiagros

Esse não é o primeiro grande pedido de recuperação judicial no agronegócio em 2024 e essa situação pode gerar impactos relevantes para os fundos de CRAs como Capitânia, JGP e XP Asset.

No CPTR11, da Capitânia, a exposição à Agrogalaxy é de 7% do PL. No XPCA11, da XP, a exposição é ainda maior, de 8,2%. Já o JGPX11 tem 8% de seu PL em CRAs da companhia.

Diante da inadimplência da Agrogalaxy, alguns fiagros já divulgaram ao mercado as medidas a serem adotadas para mitigar os impactos para os investidores.

Em fato relevante, o Fundo XPCA11 informou que realizou ajustes contábeis nos três CRAs da Agrogalaxy presentes em sua carteira, que representam 7,95%. A gestão informou ainda que vai se concentrar na recuperação do crédito afetado.

O JGPX11 da JGP Gestão de Crédito, por sua vez, também ajustou o valor contábil do CRA, o que acabou resultando em uma redução de 1,62% no seu valor patrimonial. Contudo, foi informado que isso não terá impacto imediato na distribuição de dividendos prevista. 

Já a AGRX11 pontuou que está avaliando estratégias para minimizar os efeitos da inadimplência da Agrogalaxy e informou que usará uma reserva de lucros de R$ 0,06/cota para garantir a continuidade no pagamento dos dividendos. 

Como ficam os investidores de CRAs da  AgroGalaxy?

Devido ao não pagamento da Agrogalaxy Participações S.A frente a remuneração das debêntures e de uma amortização programada para a última quarta-feira, 18 de setembro de 2024, as negociações dos CRAs da AgroGalaxy no mercado secundário foram temporariamente encerradas. 

Quem são os maiores credores da companhia?

A VERT companhia Securitizadora, que foi responsável por estruturar os CRAs (Certificado de Recebíveis do Agronegócio) da AGXY, possui R$ 516,4 milhões em aberto para receber.

Banco do Brasil também está na lista, com R$ 391,2 milhões, Santander com R$ 278,4 milhões e Citibank com R$ 106,8 milhões.

O rápido crescimento dos Fiagros e o alto custo disso 

Os Fiagros surgiram em 2021 para oferecer aos investidores uma nova oportunidade de participação direta no setor agroindustrial brasileiro, um dos pilares da economia nacional. 

Em uma janela curta de tempo, o mercado de Fiagros cresceu exponencialmente, passando de zero a R$ 30 bilhões em menos de quatro anos. 

Esse rápido crescimento foi impulsionado por promessas de exposição a setores prósperos, com retornos atrativos e grande potencial de valorização. No entanto, esse crescimento acelerado agora está cobrando seu preço.

Muitos fundos alocaram recursos de seus investidores no agro sem a devida diligência sobre as companhias do setor, em um período até então positivo, impulsionado pela alta dos preços das commodities de alguns anos atrás. 

No entanto, com a virada do ciclo econômico do agro, com queda no preço das commodities e problemas como quebras de safra, muitos devedores do setor agroindustrial enfrentaram dificuldades financeiras. O resultado? Um aumento no número de recuperações judiciais desde então, superando 400 casos no agronegócio.

Um exemplo notório é o FI-Agro VGIA11, que, há mais de um ano, lida com a inadimplência de CRAs emitidos pela Cooperativa Languiru, que não conseguiu honrar suas obrigações desde então.  

Agora, presenciamos mais um caso de uma empresa com dificuldades financeiras, impactando diretamente diversos ativos do segmento.

Esses e outros acontecimentos recentes reforçam o motivo pelo qual ainda não cobrimos os Fiagros. O mercado cresceu de forma acelerada, o que muitas vezes resulta em um desequilíbrio entre risco vs retorno.

Por isso, acreditamos que esse segmento precisa passar por um período mais longo de validação e consolidação. Somente assim poderemos avaliar com maior clareza como essas teses de investimento se comportam e se sustentam em cenários de crise.